Entrevista com a professora Ivonete Rodirgues, Mestre em Educação, especialista em Tecnologias de Informação, a seguir reproduzimos o seu conteúdo.
Alírio Soares - As escolas deveriam aproveitar com mais freqüência o recurso do filme na sala de aula? Seu uso é subestimado?
Ivonete - Penso que sim. O filme é um recurso rico, lúdico, interessante. Os alunos que temos fazem parte de uma geração eminentemente visual e tecnológica, como nos dizem alguns estudiosos do assunto. Já nasceram com televisores, aparelhos de som, telefones, computadores, videocassetes, celulares e DVDs por perto. É algo que não podemos desprezar. Já existe o uso de filmes em sala de aula, mas essa utilização não é planejada em longo prazo, não faz parte de projetos pedagógicos e raramente está conectada ao uso de outros recursos pedagógicos. Não são poucos os casos relatados de professores que nem mesmo assistiram aos filmes antes de utilizá-los com os alunos, esses profissionais usam a produção apenas porque ouviram falar que era interessante ou que versava sobre um tema relacionado aos conteúdos que estavam desenvolvendo em aula com seus pupilos. Se não houver um planejamento sério, em que o filme complemente e enriqueça as aulas, sendo posteriormente objeto de trabalhos (individuais ou em grupos), tarefas e mesmo avaliações, é preferível abrir mão e não usar o cinema na escola.
Alírio Soares - O uso de filmes em sala é considerado recurso antigo? Há professores que o vêem como antiquado?
Ivonete – Não tenho por parte dos professores nenhum comentário nesse sentido. Há professores que não gostam de usar filmes em sala de aula, outros que usam, mas não dentro de projetos pedagógicos sérios, existem ainda aqueles que pensam ser o filme apenas entretenimento e lazer e que dessa forma o utilizam em suas escolas. Não me lembro de ninguém que em algum momento tenha se referido a esse recurso como algo antiquado. Há clareza entre a maioria dos educadores do potencial da ferramenta e também de como a tecnologia evoluiu para o que temos hoje, com equipamentos portáteis e de fácil manuseio no contexto escolar atual. Quando conto aos professores que já na época de Vargas iniciaram-se de forma incipiente os primeiros projetos de cinema na escola muitos se surpreendem, ainda mais por saberem que as escolas de então tinham que adquirir equipamentos de cinemas e que isso custava muito caro e demandava bingos, rifas, sessões adicionais de filmes abertos à comunidade,...
Alírio Soares - Qual sua opinião sobre o recurso aliado à educação?
Ivonete - Creio que qualquer elemento cultural - como o cinema, o teatro, a literatura, as artes plásticas, a dança ou a música, por exemplo – constituem bases fundamentais e elementares para o processo de ensino-aprendizagem. Quanto mais utilizamos dentro de projetos esses recursos provenientes da produção artística e cultural, mais reforçamos as possibilidades de aprendizagem. O cinema, especificamente, transmite idéias através de diálogos, interpretação dos atores, figurinos, cenários, locações, músicas, efeitos sonoros, efeitos visuais... É muita riqueza, merece a nossa atenção, concede argumentos, abre espaço para debates, mexe com os sentimentos dos espectadores... Não dá para desprezar esse enorme potencial...
Alírio Soares - Em que casos pode/deve ser utilizado?
Ivonete – Pode e deve ser utilizado sempre que o professor conseguir traçar paralelos e complementar as idéias que estão sendo trabalhadas em suas aulas através de trechos de filmes ou mesmo de produções na íntegra. Filmes, ressalto, devem reforçar idéias, compor como elemento adicional, promover o enriquecimento cultural dos educandos – sempre como material extra que complementa leituras, debates, tarefas, avaliações, trabalhos em grupos,...
Alírio Soares - É preciso haver uma "alfabetização audiovisual" dos alunos para melhor aproveitamento? Como é possível alfabetizar os alunos nesse sentido?
Ivonete – O ideal é que esse trabalho com filmes, como aquele que ocorre com os livros, seja iniciado ainda na educação infantil ou nos primeiros anos do ensino fundamental. Educar o olhar, a capacidade de interpretar, de ler aquilo que está sendo trabalhado através dos filmes... Tudo isso fica mais fácil quanto mais cedo se inicia essa ação, essa prática. É algo que deve, inclusive, ser trabalhado em parceria com a família, de preferência. Diga-se de passagem, que não deve se restringir ao contato com a sétima arte, mas também com exposições, visita a museus, shows musicais, números de dança, literatura,...
Alirio Soares - E o contexto cultural do receptor? Deve haver preocupação com isso? Como é possível contextualizar o aluno?
Ivonete – O respeito à bagagem cultural do educando é de fundamental importância a todo o momento em educação. Não se pode desprezar os conhecimentos anteriores, a formação dada pelos pais, as influências do restante da família, os intercâmbios com os amigos, a religiosidade,... O uso do cinema na escola infere, assim como o de qualquer outro recurso cultural, uma clara consciência e conhecimento da clientela atendida pelo professor antes do uso de filmes em sala de aula. Dessa forma evitamos problemas e ainda otimizamos o uso do recurso. O que quero dizer com isso? Que se iremos trabalhar com grupos que vivem uma realidade distanciada, por exemplo, dos centros urbanos, devemos apresentar as cidades e orientar o olhar sem ofender as origens rurais, caipiras e interioranas dessas pessoas. Não podemos, nesse ínterim, ficar a todo o momento destacando as qualidades e as benesses da vida nas cidades e nem tampouco podemos denegrir o cotidiano das metrópoles. É necessário conhecer bem o filme que vai ser utilizado para que dificuldades de compreensão surjam e que conflitos venham a ser criados.
Alírio Soares - Que cuidados o professor deve ter antes de optar por um filme ou outro?
Ivonete – A primeira preocupação deve ser se o filme é indicado à faixa etária do grupo de alunos com os quais o professor irá trabalhar. Antes disso, o educador já deverá ter assistido ao filme no mínimo duas vezes, para conhecer a história, verificar os pontos que podem ser explorados em sua aula, preparar atividades a serem desenvolvidas pelos estudantes, traçar paralelos entre o filme e os outros recursos utilizados. A utilização dos filmes deve sempre estar relacionada aos conteúdos e práticas educacionais regularmente utilizadas pelo professor. Todo o trabalho deve ser orientado para que o aluno saiba que o filme é mais um meio de aprender, de conhecer, de crescer.
Alírio Soares - De que maneira(s) o filme pode auxiliar o ensino? Ou seria sua utilização mais adequada para a formação de valores?
Ivonete – O filme auxilia tanto na apreensão de conteúdos específicos, relacionados diretamente a demanda da grade curricular e dos planos de ensino. O que fica evidenciado, por exemplo, quando trabalhamos com uma produção como "1492 – A conquista do paraíso", que nos coloca na viagem empreendida por Colombo para a América e todo o processo inicial de colonização dos espanhóis no novo continente, ou ainda quando trabalhamos com filmes que têm como base produções literárias clássicas ou contemporâneas, como "O auto da compadecida". Permite também realizar trabalhos de formação de valores como podemos perceber com filmes do tipo "Escritores da Liberdade" ou "O clube do imperador". Dá margem também a processos reflexivos e até pode motivar as pessoas a alterar comportamentos, o que podemos perceber em filmes como "O show de Truman" e "Obrigado por fumar", apenas para citar dois exemplos. Incitar os alunos a pensar questões sociais profundas é também outra possibilidade e, nesse aspecto, o cinema nacional tem grandes obras, como "Central do Brasil" e "Cidade de Deus", apenas para ficar em dois bem óbvios.
Alírio Soares - Que resultados positivos a utilização do cinema na educação pode trazer?
Ivonete - Dá para enumerar vários benefícios, entre os quais destacaria os seguintes:
- Reforça a capacidade de argumentação;
- Melhora o vocabulário;
- Desenvolve a imaginação;
- Dá uma visão mais ampla de mundo ao estudante;
- Aproxima os conteúdos escolares do estudante por ser um recurso lúdico;
- Facilita a compreensão de temáticas que por vezes podem ser bastante complexas e difíceis de trabalhar em sala de aula;
- Abre espaço para debates e comparações com o que foi dito em aula ou estudado a partir de outras fontes;
- Mobiliza não apenas a razão e o intelecto, mas também as emoções, o que é, sem dúvida, bastante importante para que esses alunos se envolvam e tenham mais disposição para aprender.